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Os homens rãs

Última Hora , 14 de Dezembro de1951

Um dos grandes sonhos da minha vida foi ser herói de um livro que li na infância, e que se não me engano se chamava O homem-peixe. A história me transportava perdidamente e o meu amor ao mar fazia o resto. A cada releitura, era fechar os olhos e me ver dotado de guelras sob os braços transitando maciamente no fundo luminoso entre peixes temíveis, rochas de coral e carcaças de navios - que delícia visitar esses navios submersos, entrar pela chaminé e sair por uma escotilha, atravessar os conveses pacíficos despertando o deslocamento rápido de cardumes pequenos a se aquietar por ali! 

Ver este filme Os homens-rãs me lembrou muito o livrinho da infância, e eu confesso que segui a produção com o interesse que devoto a tudo o que tem a ver com o mar. Aliás, sem qualquer pretensão a grandes coisas, trata-se de um celulóide feito com lisura por um diretor cuja carreira cobre-se. Nele se conta a história de três comandos levados a efeito por um grupo da Marinha especializado em demolições submarinas - gente disposta a tudo, de heroísmo fácil, esprit de corps absoluto e crawl excelente. No comando acha-se esse bom ator que é Robert Widmark, e mais uma vez sua atuação discreta é de boa vontade e ajuda muito o espectador a passar o tempo.
 
O filme tem, a meu ver, um bom trabalho de sonorização, com um emprego médio de música e um uso do silêncio - ou melhor dos "sons do silêncio" - que, em certas partes, lhe acrescenta bastante emoção. É o que se dá, por exemplo, no episódio do torpedo, quando Robert Widmark inutiliza o detonador prestes a explodir, e no final, quando o último comando é executado contra uma base naval de submarinos japoneses. A ação ganha uma qualidade mais enervante, com esse justo uso da banda sonora. 

Os homens-rãs, é claro, é apenas um outro filme de guerra; como cinema pouco mais tem que esses momentos de tensão, e essa coisa do mar, inexplicável, que só quem ama pode entender, e que se encontra tão bem no "Bateau ivre" de Arthur Rimbaud como em Moby Dick de Melville - ou nesse livrinho O homem-peixe, que eu, ainda hoje, gostaria de encontrar e reler, pela noite adentro.