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Os homens da minha vida

A Manhã , 28 de Março de1942

Este filme de Loretta Young traz à mente uma cena que se deve repetir freqüentes vezes nos estúdios de Hollywood. Um dia, um diretor é chamado para uma conversa com os big bosses de uma produtora qualquer, não interessa o nome. O diretor senta-se, os chefões abancam-se, acendem-se os havanas, as primeiras rodelas espessas de fumo branco e cheiroso começam a evoluir sobre as calvas felizes. De repente um deles esfrega as mãos, bate na perna do diretor: 

- Então, meu velho, como vão as coisas? 

E antes mesmo que a resposta venha: 

- Temos um trabalhinho excelente para você. Something that reaily suits you. An argument, gosh, terrific; something to make big money with, what? 

O diretor, que tem andado um pouco esquecido pela fábrica, exulta intimamente, faz o possível para manter-se calmo, mas não lhe saem dos olhos as letras brancas do seu nome na apresentação do filme. Depois, um cheque gordo... talvez nem tão gordo, mas, de qualquer modo, um cheque... 

- Comecemos pelo princípio - diz ele com um ar falsamente artístico. 

O produtor então conta. Conta de como em conversa com mr. X, o conhecido roteirista, mostrara-lhe este um roteiro em que andava trabalhando, something quite different, nada de ordinary stuff, alguma coisinha realmente romântica, sobre uma ballet dancer, com uma vida de fazer inveja a Isadora Duncan.

A testa franzida, e uma cara meio amargurada, o nosso prezado capitalista fala da necessidade de se voltar ao good old time, onde se vivia num ambiente de real romance, e de se fazer com que as pessoas esqueçam os horrores da guerra, através do espetáculo da dança, do amor, do sonho, das tristezas antigas, do tempo que passa. 

O diretor exulta. Isso, sim, era matéria para ele! Vêm-lhe à cabeça imediatamente várias artistas capazes de desempenhar papel tão delicadamente feminino. Lembra um nome: o de Lorettinha, por exemplo. Pondera-se. Pede-se café. Acendem-se novos charutos. Discute-se vivamente. A "arte" começa a penetrar nesses corações endurecidos pelo comércio dos filmes. Abrem-se gestos comovidos, limpam-se lágrimas furtivas atrás de olhinhos apertados, de tanto contar dinheiro. 
- Loretta! Ela é divina! - dizem todos em coro. 

Telefona-se para Loretta. Aqui o ambiente muda. Numa casa distante, Loretta passeia no seu jardim. Loretta entra, arruma flores, ajeita o cabelo em frente aos espelhos, sorrindo da própria beleza. Loretta é o maior amor do mundo. É tão bem-intencionada! Não há nenhum mal no coração de Loretta. Tudo é tão infantil nela, que ela pode mesmo (sua beleza à parte) chegar a se interessar por uma interpretação sincera, nas mãos de um bom diretor - e eu digo um Bom Diretor. Mas Loretta não sabe o que é um bom diretor. Todos os diretores são ótimos sujeitos, fazem-lhe tantas festas, mandam-lhe orquídeas... Loretta adora fazer filmes, representar em grande camaradagem com todo mundo. 

Atendendo ao telefone ela exulta, dá gritinhos, chama o diretor de darling, diz que aquele vai ser o filme da vida dela. Isso tudo, naturalmente, é pura suposição minha, que também gosto de Loretta. E vai, surge, tempos depois, um filme chamado Os homens da minha vida que é uma boa droga, e só vale para quem, como eu, acha Loretta um anjo. 

E assim se escreve a história de um filme, em Hollywood.