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Nasci para bailar

Última Hora , 6 de Julho de1951

Dirigido por Norman Z. Mc Leod (o z por Zebra), esta fitinha da Paramount seria o fim - ou melhor, o "phyn", como diz uma amiga minha para caracterizar o limite da ruindade - não fosse por Fred Astaire. Astaire é mesmo uma coisa louca e ao lado dele até uma sílfide pesaria como um elefante. Sua graça é dificilmente transformável em palavras, mas de Astaire eu diria, parafraseando Mallarmé, que ele não é um homem, fato recomendável nesta hora de sinecuras. 

Astaire, como é sabido, é operário infatigável da sua arte. Todos os bailados que cria são meticulosamente planejados, e o grande dançarino, mesmo durante o tempo de filmagem, não pára um segundo, sempre procurando corrigir os menores defeitos que sinta nos movimentos que dança, porque ele não é um homem, e ele não dança, não. Astaire simplesmente se movimenta. Ele é uma coisa dançante ponto parágrafo. 

Sua comparsa, a frenética Betty Hutton, que Hollywood vem paulatinamente monstrificando, pula, faz caretas e canta, como de costume, as velhas rotinas em que se está estereotipando. Seu em-bom-ponto físico não a ajuda muito quando se trata de seguir a dança contrapontada de Astaire, que é a sua maior contribuição à dança no cinema, pois seus imitadores são legião, tanto homens como mulheres. Enfim, ela transpira pela gaita, o que é um sempre procurando melhorar cada vez mais. Trata-se de um perfeccionista em toda a extensão da palavra. Para mim é um prazer vê-lo volitar, exercer a sua incrível inteligência de movimentos sobre novos temas. Nesta bestidade de filme em que se meteu, como sempre, os solos que executa são o melhor que há para ver, e nota-se que poucos dançarinos há mais modestos, mais generosos para com suas companheiras. Astaire é extremamente cupincha, e sempre foi assim, desde Ginger Rogers até Betty Hutton, agora. Mas eu sustento que sua melhor comparsa foi Vera Allen. 

Podem ver a fita, por Astaire. O resto joguem bem sabem onde.