Áudio

“Vinicius – Poesia, música e paixão” é o mais completo documentário feito sobre Vinicius de Moraes. Foi produzido pela Rádio Cultura AM em 1993, por ocasião dos 80 anos do poeta e compositor, e volta a ficar acessível ao público duas décadas depois, para marcar o centenário (em 19 de outubro de 2013) de um dos mais importantes artistas brasileiros. O documentário vai ao ar numa parceria da Rádio Batuta (www.radiobatuta.com.br) com a Rádio Cultura Brasil (www.culturabrasil.com.br) e a VM Cultural, que representa a família de Vinicius. A série de 32 programas, cada um com quase uma hora de duração, tem roteiro, entrevistas e apresentação do jornalista João Máximo, um dos maiores conhecedores da história da música brasileira e biógrafo de Noel Rosa. Georgiana de Moraes, filha de Vinicius, participou da produção e das entrevistas. Há depoimentos de Tom Jobim, Chico Buarque, Baden Powell, Carlos Lyra, Edu Lobo, Francis Hime, Toquinho e vários outros artistas, além de irmãos do poeta e três das nove mulheres com quem ele se casou.

Canção do amor demais

Ao voltar ao Brasil após anos como diplomata no exterior, Vinicius ouviu, nas proximidades do porto de Santos, Canção de amor numa voz que ainda não conhecia. Era a de Elizeth Cardoso, para sempre associada pelo poeta àquele momento emocionante. Em 1958, ele teve a felicidade de ver Elizeth, a quem apelidou de Divina, gravando um disco apenas com músicas suas e de Tom Jobim:Canção do amor demais. O registro tornou-se histórico por também contar com o violão de João Gilberto em duas faixas, dando a partida na bossa nova. Do disco, podem ser ouvidas neste programa Janelas abertasModinha, Estrada branca, Medo de amar, Eu não existo sem você e, claro, Chega de saudade, dentre outras.

Por toda a minha vida

Entre 1956 e 1959, Tom Jobim e Vinicius de Moraes trabalharam intensamente juntos, compondo dezenas de músicas. João Gilberto teve nelas matéria-prima fundamental para criar a bossa nova. Neste programa, ouve-se o João de voz empostada, do início dos anos 1950, e o João do final da mesma década, o de Brigas nunca mais, da dupla Tom/Vinicius. Depois de Canção do amor demais, um segundo disco dedicado à parceria seria feito, Por toda a minha vida. Como Elizeth Cardoso, Sylvia Telles e Maysa não foram liberadas por suas gravadoras, o selo Festa escolheu Lenita Bruno, mulher de Leo Peracchi, arranjador das 13 faixas. O bel-canto de Lenina não se casou perfeitamente com as músicas, mas ela teve o privilégio de lançar Eu sei que vou te amar. Também neste programa, pode-se ouvir Vinicius recitando o seu Balada da moça do Miramar.

Em tempo de bossa nova

Vinicius de Moraes formou a trinca geradora da bossa nova com Tom Jobim e João Gilberto. Ao lado de Tom, fez as principais canções que viraram de cabeça para baixo a maneira de compor sambas (e outras bossas) no país: Chega de saudadeAmor em pazInsensatezEla é carioca etc. João, com sua voz e seu violão coesos e sem iguais, foi o intérprete que as consagrou como peças revolucionárias. Neste programa, João Máximo conta as origens desse som que todo mundo sabe o que é, mas ninguém, nem mesmo seus protagonistas, sabe definir: gênero? estilo? batida? Só é denominador comum que foi algo erguido por João, Tom e Vinicius. Ouvem-se aqui depoimentos dos dois últimos e também de Carlos Lyra, Chico Buarque e outros. E ouvem-se muitas canções, como as citadas e até "samboleros", nome dado pejorativamente às canções de fossa a que a bossa nova veio se contrapor.

Uma garota de Ipanema corre o mundo

A internacionalização da bossa nova e de Vinicius passa por Orfeu negro (o filme de Marcel Camus feito a partir da peça Orfeu da Conceição), as primeiras gravações e apresentações nos EUA e, sobretudo, por Garota de Ipanema. A canção de Tom Jobim e Vinicius foi lançada no histórico show de 1962 na boate Au Bon Gourmet, em Copacabana, e este registro original, raro e nunca comercialmente lançado, pode ser ouvido aqui, inclusive com a introdução dividida entre João Gilberto e os dois autores. Neste episódio, João Máximo traça um panorama desse voo planetário, recorda as aversões que a bossa nova enfrentou no próprio Brasil e também fala de Francis Albert Sinatra & Antonio Carlos Jobim, o salto na consolidação do brasileiro como um dos maiores compositores do mundo. A versão de Sinatra para Garota de Ipanema(acompanhado de Tom) encerra o programa.

Amigo novo, parceiro novo

Para Vinicius, parceria musical era como casamento, só que sem sexo. Enquanto Tom Jobim iniciava sua carreira internacional, Vinicius conheceu Baden Powell e compôs com ele canções que se tornaram clássicas, como Consolação e Amei tanto, ouvidas aqui nas vozes de Nara Leão e Clara Nunes, respectivamente. Além doSamba do benção, lançado por Vinicius no famoso show "O encontro". O poeta dizia que Tom, Baden e Carlos Lyra eram a sua santíssima trindade. João Máximo mostra que Baden (entrevistado no programa) fez boa parte de sua obra com Vinicius durante os três primeiros meses de amizade, período em que eles consumiram 20 caixas de uísque, ou seja, 240 garrafas.

Amigo novo, parceiro novo - 2ª parte

Continuando a tratar da parceria de Vinicius com Baden Powell, João Máximo reúne no programa saborosas histórias, como a do surgimento do samba Pra que chorar?, feito na Clínica São Vicente, no Rio, durante um suposto período de desintoxicação do poeta. A dupla bebia uísque às escondidas e concluiu a música enquanto um paciente vizinho morria. Chico Buarque acompanhou a história porque fora visitar um tio e Vinicius. No caso de Samba em prelúdio, também feita em meio a muito uísque, o letrista cismou que o parceiro estava copiando Chopin. Não estava, mas a melodia se assemalhava a uma peça de Villa-Lobos. Isto não impediu de se tornar um dos maiores sucessos dos dois. E ainda há a história de Gente humilde, composição de Garoto, ídolo de Baden, que insistiu para Vinicius criar uma letra. Demorou, mas saiu, e em Roma, ao lado de Chico, que acabou contribuindo com dois versos e virou parceiro de seu compadre. 

Em boa companhia

A primeira parte da trinca de episódios batizada como "Em boa companhia", dedicada às parcerias de Vinicius, enfoca as músicas feitas com Carlos Lyra. Ele ouvia falar de Vinicius muito antes de conhecê-lo, pois seu pai o tinha como poeta favorito. Tornaram-se grandes amigos e até cúmplices, pois Carlinhos (como era chamado pelo parceiro) concebeu com Vinicius o rapto de Nelita Abreu Rocha, a jovem que se tornou a quinta mulher do poeta e foi levada para Paris com ajuda de Tom Jobim e Fernando Sabino. Em entrevista a João Máximo, Carlos Lyra conta histórias divertidas, mas também se recorda da "melancolia profunda, infinita" do amigo, que às vezes dizia querer "desencarnar". "Quando se apaixonava, era uma festa. Mas, quando se desapaixonava, era um funeral." Músicas de amor e também as políticas são ouvidas.

No início do programa, outros parceiros como Tom Jobim, Baden Powell, Chico Buarque, Toquinho, Francis Hime, Edu Lobo e João Bosco falam da generosidade de Vinicius e da importância que ele dava às amizades.

Em boa companhia - 2ª parte

Francis Hime poderia ter se tornado engenheiro; Edu Lobo estudava Direito e cogitava ser diplomata; Chico Buarque mirava na arquitetura. Os três tiveram suas rotas de vida definitivamente desviadas para a música graças a Vinicius de Moraes. Os dois primeiros fizeram as primeiras parcerias com o poeta na casa de Olivia Hime, em Petrópolis. Para Chico, Vinicius era presença frequente em sua casa, por causa da amizade com seu pai, Sérgio Buarque de Holanda ("Ele era adorado lá em casa, um herói"). Os três dão depoimentos neste programa, no qual se ouvem algumas das criações que o letrista fez com eles: entre outras, Sem mais adeus e Teresa sabe sambar (com Francis); Só me fez bem e Canto triste (com Edu); Valsinha e Desalento(com Chico).

 

Em boa companhia - 3ª parte

O programa aborda outras parcerias de Vinicius, menos constantes, mas também significativas. O grande amigo Cyro Monteiro, o maestro Moacir Santos (foto), a cantora Alaíde Costa e os jovens (quando conheceram o poeta) João Bosco e Vicente Barreto estão entre elas. Ainda se lembra a história de Bom dia, tristeza, cujos versos foram entregues por Aracy de Almeida a Adoniran Barbosa, que criou a melodia sem conhecer Vinicius, fato raro na vida de um letrista que gostava de compor junto com os parceiros.

Pobre menina rica

O musical Pobre menina rica começou a nascer após Vinicius ver um mendigo sodomizando outro e, pouco depois, receber uma leva de melodias de Carlos Lyra em que enxergou um encadeamento. Em maio de 1963, em forma de recital, a história estreou na boate Au Bon Gourmet, no Rio, com Lyra e Nara Leão. Na hora de se gravar o disco, um ano depois, Dulce Nunes foi a cantora, já que Nara estava impedida por questões contratuais. A então pouco conhecida Elis Regina foi vetada por Tom Jobim, que acabou cedendo seu lugar de diretor musical a Radamés Gnattali. Até hoje Pobre menina rica não foi encenada como musical, apenas como recital. Este programa apresentado por João Máximo recupera toda a história, que gerou grandes músicas como Maria MoitaSabe você e A primavera.