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Provavelmente não virei montado...

Rio de Janeiro , 2004

Provavelmente não virei montado 
Em cavalo nenhum, como soía 
Nem de armadura, que essa, trago vestida 
Feita do aço da vida 
Sobre a cota de malha do silêncio. 
É possível até que chegue bêbado 
E se em janeiro, de camisa esporte. 
O importante é chegar, ser a unidade 
Ser a cidade e eu, eu e a cidade 
Ouvir de novo o mar se estilhaçando 
Nas rochas ou bramindo no oceano 
Sozinho como um Deus. Ou no verão 
No verão, quando o sol, embora oculto 
Queima a cera da Lua 
Ver - ó visão! Vênus morrer nas ondas 
A pura, a louca, a grande suicida 
Cuja morte restitui os homens à vida 
Na ilusão do tempo. Oh bem-amada 
Cidade! como mulher petrificada 
Em nádegas e seios e joelhos 
De rocha milenar, e verdejante 
Púbis e doces axilas e cabeleira 
Vegetal 
Mulher adormecida junto ao mar 
Eu te amo em teu sol e teu luar 
Junto de ti me sinto, tua luz 
Não fere o meu silêncio. O meu silêncio 
Te pertence. Eu sei que, resguardada 
De seres que se movem entre teus braços 
Teus olhos têm visões de outros espaços 
Passados e futuros. 



Esta é a cidade em que te vi passando 
Esta é a cidade que me viu sofrendo 
Esta é a cidade que trilhei fugindo 
Metrópole fatal, hosana! hosana! 
Esta é Copacabana, ampla laguna 
Curva e horizonte, arco de amor vibrando 
Suas setas de luz contra o infinito. 
Aqui meus olhos desnudaram estrelas 
Aqui meus braços discursaram à Lua 
Desabrochavam tigres dos meus passos 
E as sereias por mim se consumiam. 
Copacabana! praia de memórias 
Quantos êxtases, quantas madrugadas 
Em teu colo marítimo! esta é a areia 
Que tanto enlamacei com minhas lágrimas 
Aquele é o bar que freqüentei. Vês tu 
Aquele escuro ali? É um monumento 
Cone de sombra erguido pela noite 
Para marcar por toda a eternidade 
O local onde, um dia, fui perjuro 
Ao teu amor. Ali beijei-te ansiado 
Como se a vida fosse terminar 
Naquele louco embate. Ali cantei 
Ali menti, ali me silenciei 
Para gozo da aurora pervertida. 
Sobre o banco de pedra que ali está 
Nasceu uma poesia. Ali jurei 
Um dia me matar. Ali fui mártir 
Fui covarde, fui bárbaro, fui santo.