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A miragem

Rio de Janeiro , 2004

Não direi que a tua visão desapareceu dos meus olhos sem vida 
Nem que a tua presença se diluiu na névoa que veio. 
Busquei inutilmente acorrentar-te a um passado de dores 
Inutilmente. 
Vieste - tua sombra sem carne me acompanha 
Como o tédio da última volúpia. 
Vieste - e contigo um vago desejo de uma volta inútil 
E contigo uma vaga saudade… 
És qualquer coisa que ficará na minha vida sem termo 
Como uma aflição para todas as minhas alegrias. 
Tu és a agonia de todas as posses 
És o frio de toda a nudez 
E vã será toda a tentativa de me libertar da tua lembrança. 

Mas quando cessar em mim todo o desejo de vida 
E quando eu não for mais que o cansaço da minha caminhada pela areia 
Eu sinto que me terás como me tinhas no passado - 
Sinto que me virás oferecer a água mentirosa 
Da miragem. 
Talvez num ímpeto eu prefira colar a boca à areia estéril 
Num desejo de aniquilamento. 
Mas não. Embora sabendo que nunca alcançarei a tua imagem 
Que estará suspensa e me prometerá água 
Embora sabendo que tu és a que foge 
Eu me arrastarei para os teus braços.