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Esta semana

Última Hora , 17 de Julho de1951

A falta de cumprimento dos meus deveres de cronista foi, na semana Passada, realmente vergonhosa - e eu me penitencio publicamente. Só pude apresentar três crônicas, e assim mesmo feitas em cima da perna, tal foi o corre-corre. A de sexta-feira, por exemplo, sobre Carta venenosa, só foi entregue graças ao espírito público de um chofer de microônibus, que eu cerquei, às duas da manhã perto de minha casa no Leblon, e que se apiedou da minha urgência e do meu sono. 

É impressionante como o tempo se vem fazendo escasso para viver, tantos são os afazeres e as solicitações. Ir ao cinema, coisa que para mim em outros tempos era indispensável como o pão da boca, hoje em dia constitui quase uma agonia - pela incidência de outras obrigações nessas duas horas que seriam doces, não fosse... Enfim, chega de lamúrias, pois a verdade é que ninguém tem nada a ver com isso e que estou aqui é para fazer crônicas de cinema. 

De cinema existe isso. Às vezes até parece que não, tão largos são os lapsos entre filmes que se possam ver. Corro os olhos sobre os programas que entram esta semana: três westerns, dois thrillers, três reprises. Almas em fúria, dirigido por Anthony Mann, será provavelmente a melhor coisa a ver, apesar do vazio de tudo no final. Quando a noite desce, direção de George Sherman, eu vi nos Estados Unidos. Tem Richard Conte, que é um bom ator, tenso e discreto, e tem Nova York e seu mistério - mas não chega a ser um bom filme. Calúnia, sob o comando de Kay Garnett, é uma previsão difícil. Garnett foi, logo que começou, um diretor surpreendente. Lembro-me de SOS Iceberg e OK América, nesse período excelente do cinema americano em que um pequeno grupo de diretores tomou conta de Hollywood - entre outros William K. Howar, James Whale, Tay Garnett sobretudo. Depois ele se foi hollywoodizando, sob a pressão das injunções comerciais. Não quero dar palpite sobre esse novo filme seu sem vê-lo antes, pois Garnett ainda merece um certo respeito. 

Há também Henry Hathaway, que dirige Correio do inferno, um cowboy de classe, com Susan Hayward e o intolerável Tyrone Power. Francamente não faço muita fé, pois Hathaway não é autor muito seguido, como dizia minha avó. É um dos inventores do neo-realismo hollywoodiano, que tem dado uma série de filmes pseudamente bons - de ótima técnica fotográfica, uso abundante de locações, cenas reais, ambientes autênticos - tudo resultando em grande sofisticação final e irrealidade. 

Susan Hayward estará ainda em outro filme, O homem e sua alma, dirigido pelo veterano Henry King, que foi, grandes eras idas. Quanto a A vida recomeça, filme italiano com Alida Valli, terá pelo menos a linda estrela para ver - o que não é muito, pois mulher bonita há por aqui mesmo aos pontapés. Coisa que aliás me alegra a alma, no final desta melancólica crônica, pois é índice de que há coisas boas acontecendo por aí na sombra…