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Amor pagão

Última Hora , 23 of Septiembre of 1951

Em inglês, sereia chama-se mermaid. É mesmo o que se deve chamar, à sra. Esther Williams nesta nova produção da Metro, em tecnicolor, intitulada Amor pagão. A sra. Esther Williams está uma mermaid completa na presente versão do velho filme de Ramon Navarro, quando foi lançada a famosa "Canção do amor pagão", com a qual os brotinhos de duas décadas atrás faziam seus contracantos em casa ou nas festinhas de bairro. 

Neste atual Amor pagão, a Marca do Leão pega um de seus mais novos produtos - um homenzarrão de nome Howard Keel, que parece um Walter Pidgeon com a boca cheia de canjica de milho branco - e o leva a Taiti, herdeiro que é de uma plantação de copra. Em Taiti acha-se também a sra. Esther Williams sempre de sarong, mas o que o é ela mesmo uma rica americana que adora paraísos tropicais. 

A mermaid de Hollywood vive em constante chacrinha com os nativos, em grandes pantomimas aquáticas, nas quais se retorce mais que uma enguia. Enquanto isso, o seu comparsa dedica-se a colher copra dos cocos da sua plantação. Um dos meios que o cantante herdeiro emprega, como mão-de-obra, é dar uma festa aos nativos, enchê-los de bebida e depois pôr tudo para trabalhar de graça porque segundo Tavae, seu capataz taitiano, seus pobres companheiros topam qualquer parada por uma farrinha.
 
Cada 15 minutos Howard Keel põe-se a cantar com uma voz que meu pobre amigo, o barão de Itararé, classifica de "barítono abaixado", e que dá a impressão de estar ele com uma batata quente na boca. Sua casa, que tira fortemente ao Bambu Bar ali no Leme, acaba uma espécie de santuário ocidental, e todo o elemento autóctone nela vem depositar seus filhos, para que Howard Keel os crie. Ele que no princípio detestava crianças, porque tinha sido professor em Spring Field, Ohio ("Todas as crianças são diabinhos que usam atiradeiras…", diz o jovem mestre numa frase profundamente original), põe-se, ato contínuo, a educar as crianças com o maior entusiasmo, dando-lhes lições cantadas de etiqueta e outras matérias. Numa lição de desenho, diz ele cantando - e eu chamo a atenção de todos os pintores acadêmicos brasileiros, porque eles vão adorar o conceito - mais ou menos o seguinte: "Se o que quer é desenhar, você só tem que copiar o que vê...".
 
O verso do filme não é tão correto quanto o meu, mas a idéia é essa. E aqui eu faço uma chamada [a] Augusto Rodrigues, que em sua escolinha vem obtendo os resultados maravilhosos que se viu na recente exposição de pintura que organizou no Ministério da Educação. Não deixe, meu caro Augusto, nenhuma de suas crianças ir ver o filme!
 
O celulóide termina com Howard Keel tendo a visão da sra. Esther Williams nadando nas nuvens, e logo numa estranha ilha paradisíaca, saindo ela da Terra entre uma mermeidarada em frente e procedendo a seguir a vários jogos aquáticos que executa com o desembaraço costumeiro graças aos seus três metros de braços e quatro de pernas. Logo depois entra uma festa com muita banana e outros frutos tropicais, e o pano cai qual este pagão que aqui marchou com sete e setecentos - o que não deixa de dar uma certa raiva.