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Amigo Di Cavalcanti...

Rio de Janeiro , 2004

São Paulo, nos 66 anos do pintor mais jovem do Brasil
Amigo Di Cavalcanti 
A hora é grave e 
inconstante. 
Tudo aquilo que prezamos 
O povo, a arte, a cultura 
Vemos sendo desfigurado 
Pelos homens do passado 
Que por terror ao futuro 
Optaram pela tortura. 
Poeta Di Cavalcanti 
Nossas coisas bem-amadas 
Neste mesmo exato instante 
Estão sendo desfiguradas. 
Hay que luchar, Cavalcanti 
Como diria Neruda. 
Por isso, pinta, pintor 
Pinta, pinta, pinta, pinta 
Pinta o ódio e pinta o amor 
Com o sangue de tua tinta 
Pinta as mulheres de cor 
Na sua desgraça distinta 
Pinta o fruto e pinta a flor 
Pinta tudo que não minta 
Pinta o riso e pinta a dor 
Pinta sem abstracionismo 
Pinta a Vida, pintador 
No teu mágico realismo! 

Carioca Di Cavalcanti: 
Na rua do Riachuelo 
Nasceste, a 6 de setembro 
Do ano noventa e sete. 
Infante, foste criado 
No bairro de São Cristóvão 
Na chácara do avô materno 
Emiliano Rosa de Senna 
(Nome de avô de pintor!) 
Orgulhoso proprietário 
Do antigo morro do Pinto 
(Quem sabe não vem de herança 
O teu amor às mulatas?) 
Logo os bairros se renovam: 
Botafogo, Glória (hotel) 
Copacabana e Catete 
(O Catete de onde nunca 
Deverias ter saído 
E ao qual agora voltaste 
Humilde e reconhecido). 
Moraste no hotel Central 
E no hotel dos Estrangeiros: 
Ambos desaparecidos 
E onde à tarde, entre os amigos 
Tomavas, e com que gosto 
O melhor uísque do mundo! 
Paquetá, um céu profundo 
Que não sabe onde acabar 
Viu-te muito passear 
Ó genial vagabundo! 
- Quantas vezes foste à Europa 
Dize-me, grão-vagamundo? 

No ano de trinta e oito 
Em Paris te descobri 
Rimos e bebemos muito 
Nos bares de por ali 
Lembras-te, Di? Consue- 
Lo de Saint-Exupéry 
Saía sempre conosco 
E mais o sargento Thyrso 
Que uma noite lá, por pouco 
Não sai no braço comigo. 
Como foste meu irmão! 
Como eu fiquei teu amigo! 
E no México, te lembras? 
Com Neruda e com Siqueiros 
E a linda Maria Asúnsolo 
Que tenia blanco el pelo 
Bebemos tanta tequilla 
Que até dava gosto ver-nos 
A comer com gulodice 
Um prato de tacos pleno! 
Mais de setecentas luas 
Ungiram tua cabeça 
Que hoje é branca como a Lua 
Mas continua travessa... 
Que bom existas, pintor 
Enamorado das ruas 
Que bom vivas, que bom sejas 
Que bom lutes e construas: 
Poeta o mais carioca 
Pintor o mais brasileiro 
Entidade a mais dileta 
Do meu Rio de Janeiro 
- Perdão, meu irmão poeta: 
Nosso Rio de Janeiro!

nos 66 anos do pintor mais jovem do Brasil